Eutanásia e ortotanásia: como funcionam?

As duas palavras possuem origem grega. Eutanásia significa “boa morte” E ortotanásia, “morte correta”. Existe ainda outro termo na terminologia médica: distanásia, que carrega significado contrário ao das duas primeiras, que objetivam reduzir o sofrimento dos pacientes e reduzir a prática de tratamentos paliativos (que não poderão redundar em cura).

Esta é uma discussão do campo da ética, da bioética, que precisa ser enfrentada seriamente por profissionais das áreas da saúde, da filosofia e do direito. No Brasil, os dois procedimentos são considerados ilegais, mas o Conselho de Ética Médica considera a ortotanásia aceitável, desde que seja seguida uma série de protocolos.

Eutanásia e ortotanásia
Dispositivo para suicídio assistido, desenvolvido por técnicos da Austrália, outra nação que discute leis sobre o tema.

A primeira diferença é que, no caso da eutanásia, o corpo clínico atua de forma ativa, provocando diretamente a morte sem sofrimento do paciente, ou de forma passiva, interrompendo a ministração de medicamentos e outros cuidados médicos (neste caso, a morte pode sobrevir em um período mais ou menos longo, de acordo com a resistência física dos doentes terminais).

Morte natural

A ortotanásia é um termo amplamente empregado na comunidade científica para definir a morte natural, entendi como parte do ciclo vital, que todos nós deveremos enfrentar mais cedo ou mais tarde. Em termos práticos, é o reconhecimento dos direitos dos pacientes em terem uma morte digna, sem sofrimento e sem procedimentos que só fariam adiar o óbito.

Os defensores da ortotanásia defendem, por exemplo, a redução ou eliminação de procedimentos invasivos, do uso da ventilação pulmonar artificial, da assistência aos movimentos cardíacos e da hemodiálise (filtragem externa do sangue venoso, em casos nos quais os rins não conseguem mais cumprir as suas funções).

Estas decisões, no entanto, depois de larga discussão de uma junta médica sobre as reais condições dos pacientes. Em geral, o clínico ou cirurgião responsável pelo acompanhamento apresenta os fatos (corroborados por exames e quadros de evolução), mas se abstém de discutir o caso. Na ortotanásia, portanto, não existe a adoção de uma técnica atentatória à vida, enquanto os defensores da eutanásia podem eventualmente lançar mão de uma injeção letal.

Opiniões divergentes

O principal ponto de defesa da ortotanásia é que a persistência em tratamentos inócuos provoca sofrimento desnecessário para pacientes que muitas vezes estão em coma, com aparelhos vitais definitivamente comprometidos (como o circulatório, renal, hepático, etc.).

Não é o que avaliam a distanásia, o prolongamento da vida com o emprego de recursos artificiais e tratamentos extraordinários. Para estes cientistas, lutar até o último segundo para o bem estar dos pacientes é o verdadeiro significado da dignidade da vida. O termo é formado pelo prefixo “dis” (afastamento) e o substantivo “thanatos” (morte). Tânatos era a personificação da morte entre os gregos antigos).

A prática, no entanto, apenas prolonga, em muitos casos, uma vida vegetativa, sem contato com os familiares e o mundo exterior. Mesmo que o paciente não esteja desacordado, os muitos aparelhos ligados ao seu corpo, destinados a manter as funções vitais, impedem o diálogo e a convivência com a família e os amigos.

Diversos grupos religiosos condenam qualquer forma de apressar a vida, inclusive as três maiores religiões monoteístas do planeta: Judaísmo, Cristianismo e Islamismo. Para os representantes destes e de outros credos, a vida é uma dádiva divina – e somente Deus conhece o momento em que este dom será retirado dos mortais.

Legislações pelo mundo

A Holanda, que tem uma das legislações mais liberais do mundo, foi o primeiro país a autorizar a prática da eutanásia, com uma lei promulgada em 2002. Apenas dez anos depois, dois outros países se reuniram ao grupo: Bélgica e Luxemburgo, mas a lei foi atenuada: ela apenas impede que médicos envolvidos na prática sejam processados pela justiça.

Os três países do noroeste europeu fazem ressalvas à prática da eutanásia: ela só pode ser aplicada em pessoas com mais de 18 anos, que estejam em estado terminal ou sofram de alguma enfermidade que não pode ser combatida pelos atuais conhecimentos da medicina.

Suécia, Suíça e Alemanha adotam um procedimento semelhante à eutanásia: o suicídio assistido, em que a equipe de saúde fornece os medicamentos letais, mas o próprio paciente se responsabiliza por injetá-los na própria corrente sanguínea. A legislação suíça atrai pacientes terminais de diversos pontos da Europa, em um roteiro que ficou conhecido como “turismo da morte”.

Nos EUA, o suicídio assistido é previsto pelo Código Civil apenas nos Estados do Oregon, Washington e Vermont. Não existe uma legislação específica, mas decisões judiciais em favor dos médicos garantiram a criação de jurisprudência. Nos demais 47 Estados, a prática é considerada crime e o seu promotor, processado por homicídio.

O Conselho Federal de Medicina discorda da legalização da eutanásia, classificada como uma forma de supressão da vida humana.

No entanto, em casos de enfermidade incurável, respeitadas as vontades do paciente (ou de sua família, no caso de o doente estar em coma, mesmo que induzido), suspender o tratamento, para que o processo natural da morte siga seu curso, é uma atitude mais adequada a ser tomada.

O código de ética, entretanto, é apenas um manual de conduta, sem força de lei. O Brasil precisa avançar nas discussões sobre a ortotanásia. Muitos juristas e magistrados entendem a prática não pode ser considerada omissão do socorro – desta forma, não se configura como crime.

Alguns estudos sugerem que o procedimento faz parte do cotidiano de médicos e outros profissionais de saúde. No entanto, sem a promulgação de uma lei específica, todos estes técnicos estão sujeitos a sofrer um processo judicial, podendo inclusive ser encarcerados, de acordo com os artigos 121 e 122 do Código Penal. Os autores de ortotanásia podem ser enquadrados como homicidas simples ou qualificados. A prática da eutanásia implica crime de participação em suicídio.