Mitos e verdades sobre a reprodução humana

De acordo com pesquisas sobre fertilidade, quase 15% dos adultos em idade reprodutiva tem problemas quando decidem ter um filho. As causas são “democráticas”: um terço delas é determinado pelo homem, outro terço pelas mulheres e, finalmente, outro terço pelo casal. Mas existem muitos mitos e verdades sobre a reprodução humana. Confira o que é fato.

Estudos indicam que um casal saudável, com vida sexual regular, tem 25% de probabilidade de promover o encontro do óvulo com o espermatozoide a cada mês. A má qualidade do sêmen ou da motilidade dos espermatozoides e as condições alcalinas ou ácidas das secreções da vagina respondem pelo insucesso de três em cada quatro tentativas.

Além disto, o casal pode não ter oportunidade, pelas mais diversas razões, de transar no período da ovulação, em que o óvulo liberado está em condições de ser fecundado, “janela” que acontece por apenas 48 horas a cada ciclo. A partir dos 35 anos, as mulheres veem reduzidas as suas chances de gravidez (que se tornam nulas a partir da menopausa, quando o estoque de óvulos é esgotado).

Para os homens, não existe um “prazo de validade” preestabelecido, mas o avanço da idade (especialmente depois dos 50 anos) pode determinar a inviabilidade dos espermatozoides, mesmo que a produção seja mantida.

Meninos e meninas

Apenas para esclarecer, as meninas já nascem com um número definido de óvulos. A partir da entrada na puberdade, a cada 28 dias (em um ciclo regular), os ovários se responsabilizarão intercaladamente por liberar uma célula sexual, até que os óvulos se esgotem, período em que a menstruação deixa de ser observada.

Nos meninos, também a partir da puberdade, a produção de espermatozoides é ininterrupta até a morte, mas pode haver problemas com o sêmen (o líquido que transporta as células sexuais) ou com os canais que transportam o esperma durante a ejaculação.

Apenas para esclarecer mais um mito sobre a reprodução humana: a candidata a mãe não precisa ter os dois ovários (nem que ambos os órgãos sejam funcionais). A retirada de um ovário, por doença ou trauma, obriga o órgão gêmeo a “trabalhar em dobro”: ele passa a liberar células sexuais em todos os ciclos.

Da mesma forma, é possível engravidar mesmo quando parte o útero foi retirada. É um órgão com grande facilidade de regeneração e bastante pequeno (menor que um punho fechado, em situações normais). Havendo sobrado tecido suficiente, ele pode abrigar um feto até o termo da gestação sem apresentar problemas.

Só mulheres?

Um mito sobre a dificuldade da gravidez: a culpa é sempre das mulheres. Como já foi dito, a responsabilidade pelo insucesso em ter um filho é dividida igualmente entre o casal (atualmente, apenas 10% dos casos não têm sua origem estabelecida). Mesmo assim, o imaginário popular entende que a mulher “tem algum problema”.

Contribuindo com este mito, a Bíblia (especialmente o Antigo Testamento), conjunto de textos sagrados que constitui a base das crenças de cristãos, judeus e muçulmanos, é rica em exemplos de mulheres estéreis: Sara, mulher de Abraão (o primeiro patriarca), que só conseguiu engravidar aos 90 anos, Rebeca, mulher de Isaac (o filho temporão do casal Abraão-Sara), Raquel, esposa de Jacó (filho de Isaac), Manoá, mãe de Sansão (famoso pela força física), Ana, mãe de Samuel (um dos principais juízes de Israel) e Isabel, prima de Maria (Nossa Senhora, para os católicos), mãe de João Batista, uma espécie de precursor de Jesus, de acordo com as crenças cristãs.

A sociedade judaico-cristã se desenvolveu à sombra destes exemplos, provavelmente criados para demonstrar o poder da intercessão da Divindade em qualquer situação difícil – e não apenas na concepção e gestação. Em todos os casos, Deus intervém é proporciona a gravidez miraculosa. O fundo da história, no entanto, é a infertilidade feminina (vários maridos citados eram polígamos e tinham filhos com as outras mulheres).

Esperando a cegonha

Parentes chatos, daqueles que vivem bisbilhotando a vida alheia, quase sempre possuem um repertório limitado de especulações. Para os solteiros, sempre perguntam quando vai escolher a pretendida. Para os namorados, as questões recaem sobre a data de casamento. Para os recém-casados, a grande questão é sobre a chegada de um herdeiro.

Alguns parentes podem ser bastante agressivos. Com relação à infertilidade masculina, um dos piores comentários que ouvi – e isto depois que o casal finalmente engravidou – foi: “que bom, pensei que ele tinha o saco furado”. Felizmente, estas tiradas inoportunas quase sempre são ditas por pessoas sem vida própria, que passam a cuidar da vida alheia.

As chances (de 25%) podem ser aumentadas se o casal transar durante a ovulação. O principal sinal é o surgimento de um corrimento translúcido, semelhante à clara de ovo crua (é uma herança de nossa evolução: a secreção facilita a lubrificação da vagina e, há milênios, aumentava o desejo sexual feminino; atualmente, ela facilita o trânsito dos espermatozoides no canal vaginal).

Além disto, ocorre a elevação da temperatura corporal (em casos de “transas sob controle”, a temperatura deve ser medida na entrada da vagina), a percepção de leves contraturas no abdômen, semelhantes a pequenos choques elétricos e o aumento do apetite (sinal de que os níveis de progesterona estão mais altos).

É importante lembrar que, com exceção da secreção semitransparente, estas alterações são mínimas, só perceptíveis com o controle, realizado durante diversos meses seguidos, da temperatura, do apetite e dos desconfortos no baixo ventre.

Contraceptivos e seus problemas

Um em cada nove casais consegue engravidar no primeiro ano de tentativas. Só a partir deste momento é que homens e mulheres saudáveis devem procurar auxílio médico. Para aumentar as chances, as mulheres podem tomar ácido fólico, com orientação do médico ginecologista. A substância também previne contra algumas malformações. O importante é controlar a ansiedade e lembrar que apenas suspender os anticoncepcionais não é suficiente para uma gravidez rápida.

Um dos mitos mais comuns sobre a reprodução humana é que o uso prolongado da pílula causa infertilidade – ou ao menos dificulta a gravidez. O “causo” provavelmente foi criado nos anos 1960, quando a pílula se tornou popular e a mulher se viu livre para transar com quem quisesse, sem ter de esperar pelos “votos sagrados do matrimônio”. Pais zelosos inventaram a história para conter a “voluptuosidade” de suas filhas, mas o máximo que a pílula pode fazer é mascarar problemas pré-existentes.

Cuidados com a alimentação

Carnes magras (como filé mignon e músculo bovinos, peito de frango sem pele e peixes), legumes e produtos integrais (macarrão, arroz, biscoitos e cereais) aumentam a probabilidade de gravidez. Gorduras, embutidos, alimentos industrializados e excesso de açúcar dão mais trabalho ao organismo, provocando pressão sobre o baixo ventre e dificultando a nidação, ou fixação do zigoto ou ovo no útero.

A obesidade e mesmo o sobrepeso feminino são prejudiciais à concepção e à gravidez. Além de prejudicar o feto a ponto de determinar um aborto espontâneo, o excesso de peso predispõe ao aumento da pressão arterial e consequente instalação da pré-eclâmpsia, condição de risco de morte para a mãe e para o futuro bebê. No extremo oposto, a magreza extrema, obtida por dietas ou por problemas como anorexia e bulimia, também são inimigos da reprodução humana.

Por outro lado, o consumo de alimentos considerados fálicos, como cenoura e pepino, apesar de ser bastante saudável, não interfere em nada sobre o processo de gestação. É apenas uma identificação visual, semelhante à dos afrodisíacos (uma porção de ostras, por exemplo, teria o poder de aumentar o desejo sexual apenas por lembrar o órgão sexual feminino). Alimentos afrodisíacos não apresentam nenhum componente para melhorar a vida sexual.

O excesso de café e outras bebidas estimulantes também são prejudiciais à concepção. Mais de duas xícaras diárias (de café, é bom lembrar) podem prejudicar a fertilidade de homens e mulheres. A cafeína acelera o organismo e pode impedir o frágil encontro de espermatozoide e óvulo.

Outros fatores prejudiciais: tabagismo, utilização de drogas ilícitas e abuso de álcool. Eles não estão relacionados apenas ao mau desempenho sexual, mas interferem em todas as atividades metabólicas, aqui incluída a produção de bons espermatozoides, a liberação do óvulo no momento adequado e o estabelecimento de boas condições para a gravidez.

Gravidez assistida

Os tratamentos de gravidez assistida não são sinônimo de “bebê à vista”. A fertilização in vitro (FIV) apresenta chances de sucesso entre 25% e 55%, de acordo com as características do casal, que, quase sempre, opta por este método em idade avançada ou em outras condições clínicas, como um caso de endometriose ou de uma série de abortos naturais.

Outro mito sobre a gravidez assistida: fertilizações in vitro sempre geram gestações múltiplas, com o parto gemelar, muitas vezes acompanhada pela morte de bebês inviáveis. Nos tratamentos, é comum a implantação de vários óvulos fertilizados no útero apenas para facilitar os procedimentos. Apenas 20% das FIV resultam em gestações de gêmeos e trigêmeos.