O guia de verão da cerveja

No verão, pratos leves – como saladas, peixes e frutos do mar – ocupam o espaço de sopas e molhos condimentados. Na hora de escolher a melhor bebida para acompanhar, a cerveja é a primeira opção de muitos brasileiros, apesar de sucos e alguns vinhos brancos também serem uma boa pedida. Mas não basta escolher a marca predileta: outros elementos tornam a refeição ou a happy hour perfeita. Confira as dicas de verão da cerveja.

Em primeiro lugar, o que é cerveja? Tecnicamente, é uma bebida alcoólica carbonatada produzida a partir da fermentação de cereais maltados ricos em amido, como a cevada e o trigo. Seu preparo inclui água – que precisa ser de boa qualidade – e algumas surpresas opcionais, como frutas e ervas.

Muita gente acredita que deixar um bom número de garrafas e latas na geladeira até que a cerveja fique estupidamente gelada é o segredo para uma boa bebida. Isto é um mito: as características que conferem a refrescância vão muito além.

É preciso estar atento ao grau de teor alcoólico, citricidade e adstringência. Tudo isto vem informado nos rótulos que, infelizmente, poucos leem e são estas características que conferem o sabor ideal, especialmente para consumo no verão brasileiro, ao contrário das cervejas mais maltadas, doces e alcoólicas, mais indicadas para os dias frios. Sim, também se bebe cerveja no inverno!

A temperatura

Ela influencia na degustação, já que pode alterar a capacidade de recepção das papilas gustativas presentes na língua. As temperaturas baixas são indicadas para saborear bebidas mais leves, como as cervejas lager ou as pilsen, as mais apreciadas no país. Já os sabores e aromas mais acentuados, como os de uma bebida ale, são mais bem percebidos com uma temperatura um pouco mais quente.

Os cervejeiros costumam obedecer a uma tabela de quatro níveis, que não precisa ser exata. Só é necessário regular o termostato do refrigerador, sem necessidade de aferir a temperatura com um termômetro a cada copo servido:

• geladíssima (0°C a a4°C): pale lager (clara), sem álcool e qualquer cerveja cujo consumo seja destinado apenas a refrescar, como aquelas marcas de qualidade duvidosa que encontramos em bares e quiosques de praias quase desertas e em pequenas cidades do interior, aonde vamos para recarregar as baterias;

• bem gelada (5°C a 7°C): cervejas de trigo claras e cervejas frutadas, difíceis de encontrar no mercado. Para experimentar, é preciso encontrar lojas especializadas;

• gelada: (8°C a 12°C): lager escuras e amber (as mais douradas), bocks e cervejas de trigo escuras;

• temperatura de adega (13°C a 15°C): para as ale quadruple, strong ale escuras e a maioria das cervejas belgas a alemãs.

As cervejas claras e leves são servidas mais geladas, enquanto as mais encorpadas e de maior teor alcoólico, a temperaturas mais altas.

Para não complicar muito, a cerveja deve ficar entre 4°C e 10°C e, durante o consumo, os “cervejófilos” certamente perceberão se é preciso que fique mais gelada ou não. A maioria das tabelas foi criada na Europa, onde o clima, em geral, é bem mais ameno.

Os copos

Escolher copos especiais pode até parecer “invenção de gente sem serviço”, mas não é. O tipo de copo influi bastante em uma roda de cerveja. Na Bélgica, que oferece 450 marcas diferentes para os consumidores, cada bebida tem o seu próprio modelo. Isto acontece porque um dos prazeres da bebida passa pelos olhos: a visão de um copo de cerveja é refrescante por si só e desperta o paladar.

O design dos copos também visa preservar o aroma da cerveja. Beber com amigos em pé, no balcão de um boteco, é muito gostoso, mas não permite identificar os odores e sabores da bebida. A tulipa (pilsner) produz boa espuma e o formato direciona o cheiro do lúpulo para o nariz. O copo é parecido com o usado para lager, mas tem a boca mais fechada e vai se abrindo desde a boca (o da lager tem uma “cintura” na parte inferior).

O caldereta, bastante comum em choperias (cerveja não é chope: a primeira é pasteurizada e o segundo, apenas filtrado), armazena boa quantidade de líquido e pode substituir os demais. O pint lembra os pubs irlandeses, tem um anel largo na parte superior. Tem capacidade para mais de 600 mililitros (mais do que uma garrafa de cerveja). As canecas são encontradas em diversos formatos. Para degustação, prefira as de vidro: alumínio e cerâmica podem alterar as características da bebida.

Combinando bebida e comida

Isto nem sempre é necessário. A cerveja é tão democrática que combina com praticamente qualquer petisco ou prato, mas, quando os dois “se casam”, o resultado pode ser surpreendente. A melhor parte é que esta é uma tarefa bem mais fácil do que encontrar o vinho ideal, mesmo para paladares e narizes pouco treinados.

É possível casar cervejas por contraste. Por exemplo, um petisco gorduroso pede uma cerveja mais amarga, como as pilsen. Só para experimentar, vale a pena comprar uma pilsen europeia: as tchecas são mais ácidas do que as brasileiras. O contrário também é válido: combinar cervejas por semelhanças. Uma carne leve, como peixe ou peito de frango, cai bem com as stout (como a Guiness), de baixo teor alcoólico e sabor suave.

Engana-se quem pensa que as cervejas escuras devem ser consumidas apenas no inverno. Isto é apenas um truque publicitário para vender a bebida nos meses mais frios do ano. Há cervejas escuras suaves e encorpadas, de vários graus de teor alcoólico. A cor é definida pela torra do malte e pela adição de chocolate ou café, por exemplo.

Todo mundo sabe que cerveja e queijo são bons parceiros. A dica é experimentar algumas combinações: queijos frescos realçam o sabor das pilsen e amber lager. Os azuis, como gorgonzola e camembert, com as ale mais claras. Os defumados, com as porter. Os duros, com ale mais claras, porter, pilsen e barley. Para facilitar, queijos mais claros realçam o sabor das bebidas mais leves e os mais amarelos, das de maior teor alcoólico.

Amendoins e castanhas de caju são alimentos oleosos, um pouco mais pesados. Para contrabalançar, todas as lager e bocks (conhecidas como cervejas vermelhas) melhoram os sabores do petisco e da bebida, sem risco daquela sensação de “sufoco”. A regra é idêntica para os embutidos, como salame, copa, salsichas vienna e mortadela.

As frituras pedem atenção. A gordura e crocância dos alimentos imersos em óleo podem “roubar” o sabor da cerveja. Pasteizinhos e batatas combinam com as pilsen clássicas, mais leves e amargas. Para uma experiência nova, combine cervejas bitter com frango à passarinho ou iscas de peixe. Vale o mesmo para pratos com peixes e aves grelhados.

No churrasco, uma das preferências nacionais, as carnes mais gordurosas, como a picanha, ganham um realce quando combinadas com cervejas porter a ale claras. Os cortes mais magros, assim como filés de frango, pedem uma pilsen ou ale mais encorpadas.

Ainda sobre aves: os grelhados e assados combinam com cervejas leves, as frituras, com bebidas mais amargas (e de teor alcoólico mais alto) e defumados, com sabores mais intensos, como as amber e bock. A única preocupação é com os temperos: um grelhado muito condimentado pede cervejas de sabor sempre mais pronunciado.

Com relação às carnes vermelhas, já que estamos falando de verão, vamos “pegar leve”. Um rosbife fica ainda melhor com ale encorpadas ou lager. Bifes, steaks e bistecas, com stout, bocks e lager escuras. Os pratos mais light se harmonizam com as bebidas leves.

Condimentados ou servidos com molhos cremosos, com cervejas mais intensas.

Pode parecer estranho, mas cervejas podem ser servidas até na hora da sobremesa. Um bolo sem recheio nem cobertura realça o sabor das ale claras. Para doce de leite, as porter. Pudins, petit gateaux e cheesecakes combinam com as bebidas frutadas, mas você pode se surpreender se saboreá-los com uma ale encorpada. Por fim, quando o chocolate entra na receita, a brincadeira fica mais divertida: o doce “transforma” o sabor das cervejas escuras, ale encorpadas e porter.