Coisas nojentas sobre a comida

Gosto é gosto, não se discute. No entanto, algumas iguarias consumidas pelo mundo afora são muito nojentas. É claro que certas pessoas são mais seletivas quando se trata de comida, mas é quase certo que elas não iriam resistir a uma hecatombe nuclear, quando insetos e vermes, entre outros menos cotados, podem se tornar a única fonte de proteínas para nós, pobres seres humanos. Nestes tempos, será uma questão de comer ou morrer.

Assim, é de bom alvitre começar a se preparar para as novas e nojentas comidas que podem surgir em nossas mesas. Que tal um calango bem temperado, escorpiões na chapa. Para quem quer começar com opções mais light, podemos oferecer vermes do bambu (usados na cozinha tailandesa), cérebro de porco com creme de leite (diretamente de Phoenix, Arizona, EUA), grilos (já chegaram aos restaurantes brasileiros), língua de ovelha (portugueses espanhóis adoram) tatu, frango assado, brownies, pudim, sanduíche de mortadela… Achou estranhos os últimos itens? É que agora eles são oferecidos em lata, prontos para o consumo.

Formigas

É o caso, por exemplo, das formigas. No Vale do Paraíba (SP) e no Ceará, por exemplo, os moradores se deliciam com a içá – a popular tanajura. O inseto só cria asas na época do acasalamento, no início de cada ano, quando boa parte dos espécimes vai direto pra a frigideira.

No México, as formigas também são boas fornecedoras de nutrientes, mas lá eles preferem as ovas, chamadas de escamoles. Não é preciso achar o prato tão nojento: caviar também é uma ova e a iguaria é vendida a peso de ouro.

No México, escamoles fazem parte da alta gastronomia. Servidas fritas na manteiga, nos tacos, na brasa e com ovos (de galinha, nada de susto), fazem a festa de locais e de turistas. O problema é que as escamoleras (este é o nome da espécie) são extremamente agressivas – o que dificulta o manejo – e os criadores ainda não encontraram um método de reprodução durante todo o ano. Um prato de escamoles pode sair por até US$ 50.

Queijos

Esqueça os muitos manjares dos deuses introduzidos graças à fermentação com muitos fungos, como o camembert e o gorgonzola. Quem quer uma experiência radical precisa experimentar o casu marzu, que, em italiano, significa queijo podre. O nome é bastante sugestivo, convenhamos.

O casu marzu, derivado do queijo pecorino (feito com leite de ovelha), vai além da fermentação tradicional, chegando ao ponto de deterioração. Os habitantes da Sardenha (ilha do Mediterrâneo ocidental, uma região autônoma da Itália) introduzem diversas larvas da mosca-do-queijo (Phiophila casei) na produção, que decompõem as moléculas de gordura, tornando o queijo úmido e pastoso.

Ele é considerado tóxico quando as larvas morrem e, por isto, só é consumido quando os simpáticos animaizinhos ainda estão “preparando” a massa. As larvas são semitransparentes e atingem até oito milímetros de comprimento. Quando perturbadas, conseguem saltar até 15 centímetros de altura. Este pode ser um desestímulo, mas o pane carasau (um pão cuja refeita foi criada na Sardenha) e um belo vinho tinto grenache convencem até os mais tímidos consumidores, que podem optar por comer os bichinhos ou deixa-los de lado.

O governo da Sicília produziu a produção e venda do casu marzu, por razões sanitárias (as larvas-do-queijo são extremamente resistentes os sucos gástricos, podem provocar sérios problemas abdominais). No mercado negro da Sardenha, entretanto, ele é facilmente encontrado. O preço chega a ser o dobro de um pecorino tradicional.

Existem outras variações: no Piemonte (norte da Itália), os queijos – feitos com leite de cabra – são deixados ao relento, para que as larvas façam o seu trabalho. Em seguida, no entanto, as peças são postas em processo de maturação em mel, vinho branco e uvas, o que impede a emersão das novas moscas e confere um sabor forte. Na França e na Alemanha, são produzidos respectivamente o mimolette e o milbenkäse. Nestas receitas, as larvas são substituídas por ácaros.

Peixe com soda

Pode esquecer o refrigerante. Na Noruega, é utilizada soda cáustica na preparação de peixes brancos secos, como o bacalhau. Os peixes, mesmo imersos em hidróxido de sódio por dois dias ou mais, continuam se desenvolvendo (mais do que os animais frescos), mas perdem quase metade da proteína, o que lhes confere um aspecto gelatinoso, característico do lutefisk, bastante famoso no país. Para equilibrar o pH da carne, que se eleva a 11 ou 12, é preciso imergi-la em água fria por vários dias. Uma curiosidade: depois de preparado, é preciso lavar a frigideira imediatamente. Do contrário, os restos endurecem de tal forma que a limpeza se torna impossível.

Na vizinha Finlândia, a iguaria recebe o nome de lipeäkala e, na Suécia, lutfisk (em todos os idiomas, a tradução literal é “peixe com soda cáustica”). Trata-se de um prato para ocasiões festivas. Os EUA também são grandes consumidores do lutefisk.

Fortalecendo a saúde

O baby mice wine é um tônico bastante consumido na China e na Coreia. Conseguiu traduzir o nome? Significa vinho de filhotes de tatos. Parece que os orientais gostam de beber gasolina, já que foi assim que muitos consumidores corajosos definiram o sabor do vinho de ratinhos.

A receita é bem simples: basta encontrar uma ninhada de ratos recém-nascidos (com os olhos ainda fechados), separá-los da mãe e coloca-los em uma garrafa de vinho de arroz, onde os filhotes ficarão fermentando. O segredo é fazer a mistura com os ratos ainda vivos.

Cabeça no café da manhã

Quem não se lembra da saga “O Poderoso Chefão”, dirigida por Francis Ford Copolla e estrelada por Marlon Brando? No primeiro longa-metragem, uma das cenas antológicas é a que mostra um “presente” do capo para um desafeto: uma cabeça decapitada de cavalo, avistada imediatamente quando oi chefe mafioso despertou de seu descanso noturno.

Pois bem, no Iraque, qualquer turista, especialmente no inverno pode se aproximar bastante do clima cinematográfico: basta pedir um pacha para oi café da manhã. O prato leva na receita vários cortes de carneiro, inclusive a cabeça intacta. As patas e o bucho também são aproveitados na preparação desta comida nojenta.

Uma entrada mais light

Para quem considerou o pacha um tanto indigesto, os vietnamitas têm a iguaria ideal: tiêt cahn, uma sopa fria quase sempre servida nos lanches da manhã e da tarde. O ingrediente principal é sangue de pato (que pode ser substituído por sangue de porco, cão ou veado). Depois que o pato é morto, o sangue é retirado e refrigerado por 24 horas.

O frio coagula o sangue, que ganha uma textura semelhante à da gelatina. Alguns chefs preferem adicionar molho de peixe, para que o sangue não fique totalmente coagulado. A carne e as vísceras são cozidas, cobertas com o sangue e temperadas com gengibre, manjericão, vinagre e amendoim. O tiêt cahn é servido tortilhas de arroz e gergelim, com papel-de-arroz ou bang trang me, uma espécie de biscoito também à base de arroz.

Mais pato

Nas Filipinas, no Vietnam e no Camboja, o balut é um dos pratos mais apreciados. Trata-se de ovos de patos incubados apenas até a formação do bico e dos ossos, 17 dias depois da concepção. Em seguida, os ovos são fervidos com os filhotes ainda vivos. Dizem que os ossos ainda mal formados conferem uma textura crocante dificilmente encontrada em outros pratos.

O balut é vendido nas ruas, por ambulantes. É o cachorro-quente destes países, temperados com sal, limão e pimenta e saboreado com cerveja. Os homens garantem que ele é um excelente natural e sem contraindicações para o Viagra.

Coisa de roqueiro

Há pouco mais de 30 anos, o cantor Ozzy Ousborne surpreendeu a plateia, ao morder a cabeça de um morcego em pleno palco. Depois de muitos tratamentos, o roqueiro disse para a imprensa ter achado que era um bicho de plástico. Chegou a descrever a comida nojenta: “é bem crocante”.

Os moradores de Palau, país insular na Micronésia (oceano Pacífico), não são muito chegados ao heavy metal, mas têm algo em comum com Osbourne: eles adoram comer morcegos. Um dos pratos típicos da ilha é a sopa de morcegos, feita com os mamíferos voadores, cebola, cebolinha e creme de coco ou molho de soja. Os nativos dizem que, há algumas décadas, era mais fácil encontrar morcegos, que estão desaparecendo em função da caça sem critérios.

Um cafezinho, para arrematar

O café é consumido praticamente em todo o mundo, mas quem diria que a planta, tão bem adaptada ao solo e clima brasileiros, poderia ser cultivada de forma bizarra. É o kopi luwak, cultivado na Indonésia, o café mais caro do mundo: o quilo pode ser vendido por até US$ 1.200. Especialistas afirmam que o sabor é incomparável.

No entanto, o que faz a fama do café indonésio é a forma como ele é colhido. O kopi luwak é um grão de café digerido pela civeta, animal aparentado com o gambá. Só depois do processo completo é que os grãos são colhidos, diretamente do chão. Em outras palavras, o segredo do sabor e aroma deste café, que faz a alegria de milionários espalhados pelo mundo, é ter sido defecado. O que as pessoas não fazem para degustar uma bebida única, não é?