Quando a adolescência não acaba

Hormônios em ebulição, descobertas de novos prazeres, angústias, mudanças no corpo. Tudo isto ocorre em um período muito curto, geralmente entre os 12 e 18 anos, sem dar tempo ao indivíduo para processar tantas alterações. No campo social, surgem obrigações que nem sempre são bem-vindas: trabalhar, escolher uma carreira, assumir responsabilidades. Mas, falando francamente, a adolescência não tem data para acabar.

Muitos pais se preocupam com comportamentos infantilizados dos filhos, que não parecem querer dizer adeus mesmo aos 20, 22, 25 anos. A preocupação, no entanto, é desnecessária: se não houver problemas cognitivos e se os adolescentes se mostrarem socialmente ajustados – na medida do possível –, especialistas garantem que tudo está correndo bem.

Na verdade, os psicólogos tendem a encarar um continuum na formação do ser, que vai do nascimento aos 25 anos. A partir da puberdade (menstruação para as meninas, ejaculação para os garotos), tudo parece ocorrer de forma mais intensa; na adolescência, muitos jovens podem ter o seu desenvolvimento físico encerrado aos 14 anos, mas o desenvolvimento emocional está longe de se completar.

Mudanças do tratamento

A nova proposta dos especialistas é garantir que os jovens de 18 a 25 anos continuem recebendo o mesmo amparo e atendimento. E não apenas em casa, mas também pela sociedade, e isto abrange escola, trabalho, lazer e namoro, com suas “dores e delícias”.

Há muito pouco tempo, a adolescência não existia. Na verdade, existia, mas a sociedade não queria enxergar. Os pais queriam casar as filhas o mais cedo possível, para que elas “sossegassem”. No caso dos filhos, havia os bordéis, com exceção de ambientes muito puritanos. Passada a primeira infância, os jovens eram tratados como miniadultos.

O historiador francês Phillippe Ariès, morto em 1984, foi um profundo estudioso a estrutura familiar. Em seu livro “A História Social da Família e da Criança” e demonstra como, por vários séculos, os desejos e necessidades de crianças e jovens foram negligenciados, ao menos no Ocidente. Eles trabalhavam, se casavam e deixavam a casa dos pais. Os adolescentes começaram a reclamar seus direitos com mais veemência com o aumento do tempo de permanência na escola.

A neurociência também deu grandes contribuições, ao demonstrar que o desenvolvimento emocional não tem um momento certo para se completar. A adolescência é dividida em três fases: inicial (dos 12 aos 14 anos), intermediária (dos 15 aos 17 anos) e final (dos 18 anos em diante). A maturidade emocional, a autoimagem e a capacidade de julgamento só se completam desta última etapa, com o desenvolvimento completo do córtex pré-frontal. A atividade hormonal também só estabiliza bem depois dos vinte e poucos anos.

Poderíamos dizer que existe um quarto estágio, entre os 19 e 25 anos, em que os jovens precisam se ajustar à vida adulta.

Mesmo assim, os jovens mais pobres começam a trabalhar mais cedo e podem ter a adolescência comprometida, apesar de continuarem sujeitos aos aspectos emocionais desta etapa da vida. Na outra ponta do espectro, jovens de classe média e alta permanecem com os pais por mais tempo, criando uma extensão da dependência que pode atingir os 30 anos. Nestes casos, os comprometimentos emocionais podem se tornar realmente sérios.

Jovens infantilizados

Programas de TV voltados para esta faixa etária retratam adolescentes que simplesmente não querem crescer e assumir as responsabilidades da vida. Em contraponto, surgem rapazes e moços que querem se desvencilhar de pais autoritários e superprotetores, mas não encontram instrumentos para romper os laços familiares.

Estes estereótipos retratam, em certa medida, o dia a dia dos jovens infantilizados. A nova conduta dos pais tornou os jovens mais confiantes na família, mas preocupados com as “aventuras” de partir para o mundo. Está ocorrendo uma perda da aspiração por independência e se instalando um medo irracional de viver sozinho.

Contraditoriamente, crianças e adolescentes estão sendo submetidos a uma corrida desenfreada para a maturidade. Brincadeiras de rua não são mais admitidas (talvez por medo da violência urbana). Crianças de quatro anos não sabem andar de bicicleta, mas conseguem manejar tablets, computadores e smartphones com maestria.

Logo no início da adolescência, os meninos ganham cosméticos, roupas de grife, salto alto, piercings, pequenas tatuagens – de que eles podem se arrepender depois (quando tiverem, por exemplo, de encarar o mercado de trabalho e encontrarem um chefe muito conservador). O horário de ir para a cama não é vigiado pelos pais.

A precocidade e a excessiva exposição às informações geram alguns problemas. No século XVIII, a menarca (primeira menstruação) ocorria por volta dos 15 anos; hoje, três anos mais cedo. Metade dos jovens brasileiros de dez a 12 anos já experimentou álcool e a vida sexual tem início cada dia mais cedo, em torno dos 14 anos, inclusive com um problema social sério: meninas de menor condição financeira engravidam não por que não tenham informações sobre anticoncepcionais, mas porque a gravidez significa independência.

Por isto, é cada vez maior o número de jovens de 24 ou 25 anos vivendo dependentes dos pais – e não apenas no aspecto financeiro.

Isto tem seu lado negativo – imaturidade, instabilidade emocional, reforço da passividade e impotência –, mas, por outro lado, amplia as oportunidades de estudos e, quando bem orientados, os jovens podem utilizar este estágio para construir o autoconhecimento, tarefa pessoal e intransferível.

Os pais precisam ficar atentos. Em muitas famílias, adolescentes de 12 e 13 anos não podem sair sozinhos – o que se torna progressivamente um instrumento de castração psicológica. Aos 15, as atividades são tão vigiadas pelos responsáveis – que talvez queiram se sentir próximos –, que parte do prazer em estar com amigos ou com a namorada se perde. Por fim, é comum ver estudantes universitários sendo tratados como alunos da educação básica.

Ritos de passagem

Adolescentes estão sempre expostos aos chamados ritos de passagem: ir para a escola sem a companhia dos pais, encontrar o primeiro amor, definir a profissão, iniciar-se sexualmente. A liberdade atribuída aos filhos deve ser sempre proporcional à responsabilidade que eles demonstram, sempre sem os prejudiciais excessos de zelo.

A ajuda financeira é sempre-bem vinda, mas deve se limitar às despesas básicas. Um adolescente pode arranjar um emprego free-lancer para fazer uma viagem com amigos, sem onerar o orçamento doméstico. Pela mesma razão, é irreal que os pais permitam que o filho more sozinho, mas paguem as despesas do novo apartamento.

Na verdade, deixar os filhos livres para o mundo não vai acabar com as aflições e inseguranças da adolescência. Todos nós continuamos tendo estes sentimentos de tempos em tempos. O ideal é preparar os jovens para que eles queiram criar asas e conquistar a independência.