Os arquivos secretos do Vaticano

O Vaticano é um Estado independente desde 1929, governado pelo papa, a suprema autoridade da Igreja Católica Apostólica Romana. Há alguns séculos, os Estados pontifícios ocupavam toda a Itália central. No século XIX, a autoridade papal se resumia à cidade de Roma e, atualmente, se limitam a 0,44 km2. No entanto, mesmo em um espaço tão pequeno, o país guarda muitos segredos. Entre eles, os arquivos secretos.

Tudo o que é oculto, secreto ou proibido para os olhos dos comuns mortais é motivo de curiosidade, pesquisa e até mesmo espionagem. Os arquivos secretos do Vaticano se enquadram nesta categoria. Guardados em uma biblioteca, com 85 quilômetros de prateleiras repletas de livros, documentos e imagens acumuladas durante oito séculos (que somam dois milhões de registros), os papéis são classificados como “de acesso restrito”. Na verdade, apenas parte do acervo é franqueada à visitação pública.

A varanda do palácio, de onde o papa se dirige oficialmente para os fiéis católicos.
A varanda do palácio, de onde o papa se dirige oficialmente para os fiéis católicos.

A natureza dos documentos

Muitos autores afirmam que os arquivos secretos do Vaticano – ou, pelo menos, boa parte deles – são documentos comuns a qualquer Estado independente. No Brasil, por exemplo, diversos documentos sobre ações adotadas pela ditadura militar permanecem protegidos pelo sigilo, inacessíveis a pesquisadores.

O divórcio de Henrique VIII e a princesa espanhola Catarina de Aragão, permanece entre os arquivos secretos do Vaticano. A separação, que possibilitou o casamento do rei inglês com Ana Bolena. Este fato histórico foi o motivo principal para a separação entre a Inglaterra e os Estados Pontifícios, originando o Anglicanismo.

Seja como for, os arquivos secretos do Vaticano guardam muitos documentos sobre o período da Inquisição (que durou dos séculos XII ao XIX), que levou muitas pessoas à tortura e à fogueira. Outros fatos mais prosaicos poderiam estar arquivados, como os contatos de papas com alienígenas.

Os documentos mais recentes dos arquivos secretos do Vaticano são privativos da cúria romana (bispos e arcebispos católicos). O restante é disponibilizado para pesquisadores, mas, mesmo assim, é necessário passar por uma pré-seleção, a cargo das autoridades católicas da sede da Igreja.

A Praça de São Pedro, no Vaticano.
A Praça de São Pedro, no Vaticano.

O segredo do Vaticano

Mas, afinal, o que há de tão secreto nos arquivos secretos do Vaticano? Alguns historiadores afirmam que alguns registros poderiam mudar a história não apenas do Cristianismo, mas da própria história da humanidade – em alguns casos, uma guinada de 180°.

Nesta biblioteca, estão guardados alguns evangelhos apócrifos (não adotados pela Igreja, que, no século IV, adotou apenas os livros de Mateus, Marcos, Lucas e João, todos canonizados pela Igreja Católica). Alguns são apenas variações dos evangelhos oficiais, mas outros guardam segredos inconvenientes, como o casamento (com filhos) de Jesus e Maria Madalena e os motivos reais que determinaram a renúncia do papa Bento XVI.

O código

O código da Bíblia, igualmente conhecido como código da Torá (os cinco primeiros livros bíblicos, cuja autoria é conferida a Moises), também está incluído entre os arquivos secretos do Vaticano. Trata-se de trechos do Antigo Testamento, frases e períodos que teriam um significado especial e oculto.

Alguns teólogos e historiadores acreditam que estas passagens bíblicas foram incluídas intencionalmente, de forma codificada e oculta, e só podem ser decifrados por pessoas predestinadas para esta missão. arquivos secretos do Vaticano. O matemático israelense Eliyahu Rips e o jornalista americano Michael Drosnin estão convencidos de que os códigos podem ser decifrados por operações matemáticas, mas, por serem muito complexas, elas só poderiam ser executadas por computadores.

Entre as revelações, estariam o Holocausto alemão (praticado durante a Segunda Guerra Mundial), a morte do líder israelense Yitzak Rabin e a posse do presidente americano Bill Clinton, em 1993, depois de 16 anos do Partido Republicano no poder.

Na contramão desta história, a Sociedade Bíblica Alemã publicou um estudo afirmando que “Deus não fala por códigos”. Por outro lado, a revista “Bibel Report”, também alemã, afirmou que, por meio de combinações certas de letras, é possível ter acesso aos principais eventos históricos futuros.

Com a sua metodologia, Michael Drosnin, autor de “O Código da Bíblia”, conseguiu encontrar alguns poucos acontecimentos futuros. A maioria, no entanto, ainda precisa ser descoberta – e consta que várias revelações estão ocultas nos arquivos secretos do Vaticano.

Seja como for, antes de se pensar em conspirações secretas, é preciso lembrar que o Antigo Testamento foi escrito em hebraico, que não possuía vogais. Isto torna as palavras mais curtas e suscetíveis a diversas interpretações. Desta maneira, as chances de encontrar “mistérios” são muito maiores.

As aparições em Fátima

Outro dos arquivos secretos do Vaticano é o terceiro segredo de Fátima. Entre maio e outubro de 1917, Nossa Senhora teria aparecido repetidas vezes para três crianças, filhas de camponeses, em Fátima, Portugal. As duas primeiras revelações foram divulgadas em 1941, por uma das crianças que se tornou freira.

A primeira revelação da Virgem Maria foi a ratificação da existência do Inferno. As crianças teriam tido visões tenebrosas com almas condenadas, retorcendo-se de dor entre as chamas eternas. A segunda apresentou o plano de Deus para resguardar as criaturas humanas, através da devoção ao Sagrado Coração de Maria.

Nossa Senhora pediu orações e outros atos de fé, como novenas e procissões. A santa afirma que a guerra (Primeira Guerra Mundial) acabaria em breve, mas, se os homens não se convertessem, haveria outro confronto bélico ainda sob o pontificado de Pio XI (papa de 1929 a 1939, morto pouco antes da eclosão da Segunda Guerra Mundial).

Ainda de acordo com a Virgem Maria, se a humanidade não se arrependesse dos seus pecados (e fizesse penitência), surgiria um sinal dos céus: durante certa noite, uma luz estranha iluminaria o firmamento, prenúncio do castigo divino.

A terceira revelação foi divulgada parcialmente. Ao lado de Nossa Senhora, figurava um anjo armado com uma espada flamejante que parecia incendiar o mundo. Ao toque da Virgem, no entanto, as chamas se apagavam. O anjo, apontando a espada, não cessava de exclamar: “penitência, penitência, penitência”.

O restante da mensagem, que parece anunciar o fim dos tempos (o Apocalipse), nunca foi divulgado para os fiéis – continua ocultado em um dos arquivos secretos do Vaticano.

Alguns documentos importantes

Os arquivos secretos do Vaticano guardam (ou ocultam) alguns documentos reveladores. Entre eles uma carta da rainha escocesa Mary Stuart, escrita em 1586, época em que a Inglaterra já estava convertida ao Anglicanismo. Na carta, a monarca pede perdão pelos seus pecados, implora pela sua vida e afirma lealdade à fé católica.

O julgamento dos templários

A Ordem dos Pobres Cavaleiros de Cristo e do Templo de Salomão foi uma ordem militar da Cavalaria, fundada pouco depois da primeira Cruzada (1096), com objetivo de defender os cristãos que voltaram a Jerusalém, após uma conquista efêmera.

Os membros da Ordem dos Templários faziam voto de castidade e pobreza, usavam mantos brancos e tinham como brasão um cavalo montado por dois cavaleiros, uma expressão de fraternidade. Quando os europeus foram definitivamente derrotados e expulsos da Terra Santa, no entanto, a ordem foi sensivelmente reduzida.

A proximidade dos templários com pessoas influentes nos reinos europeus passou a despertar desconfiança. Felipe IV da França (também conhecido como Felipe, o Belo), passou a pressionar o papa Clemente V a tomar medidas contra eles.

Finalmente, em 1307, muitos membros franceses da ordem foram detidos e levados à fogueira. Cinco anos depois, o sumo pontífice dissolveu a ordem definitivamente. Os templários estão envolvidos em diversos mitos e especulações.

Apesar do voto de pobreza, a ordem era detentora de muitos tesouros, alguns deles trazidos da Terra Santa como despojos de guerra. Um dos arquivos secretos do Vaticano, escrito em pergaminho, é um documento oficial que revela detalhes do julgamento dos templários. A ordem foi considerada herética no início do século XIV: era um pretexto para retirá-los de cena.

Um divórcio tumultuado

No início do século XVI, ao ascender ao trono da Inglaterra (e, posteriormente, da Irlanda), Henrique VIII casou-se com Catarina de Aragão, princesa da então poderosa Espanha, detentora da maior armada militar da Europa.

Durante 24 anos, apesar das escapadas de Henrique, o casamento se manteve. Frustrado por não ter um filho que o sucedesse no trono (Catarina teve apenas uma filha, Maria I – a Bloody Mary, ou Maria Sanguinária, que sucedeu o pai), o rei inglês decidiu-se pela separação. O Vaticano, no entanto, temeroso da reação da Espanha, recusou o pedido de divórcio. Depois de muitas idas e vindas, Henrique VIII rompeu com a Igreja Católica e instituiu o Anglicanismo (que não considera o matrimônio como um sacramento).

Entre os documentos mais adornados dos arquivos secretos do Vaticano, guarnecido por 80 selos vermelhos, é uma carta dos bispos ingleses, um pedido para que Clemente VII intercedesse em favor do divórcio. O manuscrito, que não foi atendido pela Santa Sé, só foi reencontrado em 1926, oculto embaixo de uma pesada cadeira em uma câmara do Vaticano.

Eppur se muove

Esta frase, em italiano, teria sido pronunciada pelo astrônomo Galileu Galilei em 1633, depois de ter sido obrigado a rejeitar, para evitar a morte na fogueira, a teoria do heliocentrismo, segundo a qual a Terra orbita o Sol. À época, o heliocentrismo contrariava os dogmas da Igreja Católica (e também das igrejas reformadas), para a qual o nosso planeta era o centro do universo.

Galileu Galilei passou o restante da vida em prisão domiciliar – foram nove anos de isolamento, durante os quais o astrônomo foi proibido de lecionar e de manter “contatos intelectuais”. Um item extremamente valioso dos arquivos secretos do Vaticano é uma carta de Galilei retratando-se por sua heresia. A Igreja Católica admitiu o erro apenas em 1992.

Um raro documento asiático

Com o avanço do Protestantismo e a “ampliação do mundo” – o traçado de novas rotas para o Oriente e, posteriormente, com a descoberta da América, a Igreja Católica fundou a Companhia de Jesus em 1534, inicialmente coordenada por Inácio de Loyola. No Brasil, os jesuítas desembarcaram juntamente com Tomé de Sousa, em 1549.

Os objetivos eram claros: levar a fé católica a regiões recém-descobertas e difundir a religião na África e na Ásia. Entre os arquivos secretos do Vaticano, consta um dos poucos documentos vindos do Oriente: uma carta da imperatriz chinesa Wang, que adotou o nome cristão de Helena (o nome da mãe do imperador romano Constantino II, que alçou a Igreja Católica ao status de religião oficial do império).

Na carta endereçada ao papa Inocêncio X, Wang/ Helena, convertida pelos padres jesuítas missionários, promete lealdade ao Catolicismo e comunica ter dado ao seu filho Yongli, herdeiro do trono da China, o nome de Constantino.

Uma rainha escocesa

Mary Stuart, depois de muitas reviravoltas, foi presa na Inglaterra, acusada de conspiração. Em 1657, a rainha católica foi executada. No momento da morte, depois de retiradas as roupas externas, a rainha revelou uma anágua preta e luvas vermelhas, cores litúrgicas da Igreja.

Mary foi decapitada, pondo fim às pretensões do Vaticano em restaurar o Catolicismo na Inglaterra (e no reino anexado, a Escócia). Em correspondência à Santa Sé, Mary Stuart havia declarado, pouco antes, que a sua morte era herética e ilegítima.

Os documentos sobre o julgamento dos cavaleiros templários, uma espécie de misto entre ordem religiosa e batalhão que atuou durante as Cruzadas (que pretenderam, sem sucesso, ocupar a Terra Santa), também figuram entre os arquivos secretos do Vaticano.

A ordem foi perseguida por Felipe IV, da França, que desconfiava dos reais motivos que inspiravam as ações dos cavaleiros templários. A Ordem dos Pobres Cavaleiros de Cristo e do Templo de Salomão (talvez os cavaleiros estivessem procurando os tesouros ocultos do lendário rei judeu) foi extinta com uma chacina: em 1314, Felipe, com o apoio do papa Clemente V, os líderes foram enviados para a fogueira (considerada, à época, uma espécie de “morte natural”).

Uma carta indígena

Pode parecer improvável, mas, entre os arquivos secretos do Vaticano, figura uma carta de um cacique da tribo Obijwe (Grassy Lake, Canadá), endereçada ao papa Leão XIII, papa de 1878 a 1903. A carta agradece a Deus e ao papa, tratado como “representante de Cristo na Terra”.

A carta foi escrita em dialeto obijwe e traduzida por um missionário francês. O cacique, aparentemente convertido ao Catolicismo, agradece pelas bênçãos recebidas e coloca os serviços da sua nação aos serviços do Vaticano.