Conheça as cabras que sobem em árvores

Se você estiver viajando pelas regiões de Marrakesh e Essaouira, no sudoeste de Marrocos, não se assuste, nem pense que seus olhos estão pregando uma peça: as cabras da região desenvolveram uma estranha habilidade, já registrada por muitos cinegrafistas e fotógrafos: elas aprenderam a subir em árvores – especialmente na Argania espinosa – e fazem isto não apenas para descansar ou se divertir, mas principalmente para devorar um de seus alimentos prediletos: os frutos do argan, tradicionalmente utilizados em forma de óleo na culinária e que atualmente estão fazendo um tremendo sucesso na hidratação e regeneração dos cabelos.

cabras-em-arvore-2

 

Nas escaladas nas árvores – que se transformam em verdadeiros pés de cabra –, os animais conseguem se sustentar mesmo nos galhos mais finos. A habilidade de subir em qualquer superfície é comum a estes caprinos, conhecidos há séculos pelo homem. Eles conseguem escalar paredões rochosos quase verticais com facilidade, tarefa que os melhores alpinistas só conseguem vencer com a ajuda de equipamentos especializados, como cordas e mosquetões.

Um pouco de história sobre as cabras em árvores

As cabras são os menores ruminantes criados pelo homem. Elas convivem conosco há pelo menos nove mil anos. São animais bastante resistentes ao frio: seu hábitat são as montanhas temperadas. A alta altitude exigiu que estes animais desenvolvessem pulmões adaptados ao ar rarefeito, vivendo tranquilamente em um ambiente pouco acessível aos predadores.

cabras-em-arvore-1

As primeiras notícias sobre a criação de cabras vêm de grupos nômades do Oriente Médio (em especial, na Mesopotâmia, atual Iraque), que domesticaram as cabras a partir de espécies selvagens. Naquela época, elas se mostraram ideais para povos que ainda não haviam criado aldeias e cidades e viviam se deslocando de um ponto a outro, em busca de melhores condições de vida.

Cabras fornecem lã, leite, carne, couro e estrume (um excelente adubo para as gerações posteriores, que começaram a desenvolver a agricultura). Elas são excelentes exploradoras (como se pode ver em sua recente habilidade de subir em árvores) e conseguem encontrar alimento sem ajuda dos pastores, características que as tornaram uma excelente opção para criação.

Cabras aranhas

Por instinto de sobrevivência, estas cabras escolhem os locais de maior altitude e com isto desenvolveram muitas técnicas de alpinismo. Adaptadas ao convívio com os homens, elas simplesmente trocaram as rochas pelo que lhes pareceu o local mais seguro: o alto das árvores. Aliás, nas áreas de criação, pomares e bosques precisam ser cercados para que elas não destruam arbustos e árvores.

cabras-em-arvore

Sem encontrar o que comer no solo semiárido do vale do rio Sous (especialmente na região de Tamri, uma aldeia próximo à cidade de Agadir), as cabras marroquinas tiveram que “quebrar um galho”. Depois de descobrir os petiscos nas árvores de argan (semelhantes a azeitonas), os bandos são capazes de acabar com toda a copa – galhos, folhas e frutas – em poucas horas. Parecem gafanhotos.

Parece montagem eletrônica, mas não é. A argânia se parece com uma oliveira, planta comum no Mediterrâneo. Mas, ao contrário do território de Marrocos, em outras regiões o alimento é abundante e, por isto, não houve necessidade de outros desenvolverem a habilidade de se aparentar com as aves – que, aliás, são expulsas pelos caprinos – e balir de galho em galho.

O segredo da capacidade de escalar parece estar no formato das patas. O casco, bastante reforçado por queratina, adiciona força, enquanto a parte posterior, de textura macia, garante tração e aderência. As patas também conseguem se deformar internamente, facilitando a passagem pelas irregularidades do terreno.

A comparação com gafanhotos, no entanto, fica apenas na voracidade com que as cabras se alimentam. Elas não são uma praga, nem prejudicam a vida das árvores (ao contrário da ação humana). Na verdade, os agricultores berberes (um grupo linguístico, e não uma etnia) vão atrás dos rebanhos para recolher as sementes cuspidas ou excretadas com as fezes (o organismo das cabras não tem capacidade de digeri-las), uma excelente fonte de renda, pois são vendidas para a indústria alimentícia e de cosméticos. Mas o homem tem derrubado muitas destas plantas, para aumento da área de pastoreio e para uso na marcenaria.

As sementes de argan são recolhidas há séculos pelos povos locais, fato que gerou um decréscimo da população de árvores. Mas, como sempre sobram algumas, novas plantas florescem e isto reduz o impacto ambiental desta atividade extrativa.

Definitivamente, se voar é para os pássaros, passear entre os galhos das árvores não é mais uma exclusividade das aves, primatas e serpentes: as cabras, mesmo com cascos nas quatro patas, descobriram uma forma criativa de driblar a falta de comida no solo.

Relacionados