Cachoeiras na selva de pedra

São Paulo é o maior centro financeiro, comercial e corporativo da América do Sul. Na região metropolitana, convivem mais de 20 milhões de pessoas, mais de 8,5 milhões de veículos, às vezes de forma caótica. No entanto, quem mora na chamada selva de pedra e curte um contato direto com a natureza não precisa viajar muito para se integrar com o verde. É possível até tomar banhos em algumas cachoeiras.

A cidade tem quase 40% do seu território coberto por áreas verdes. Ainda é pouco, mas o problema maior não é este: a cobertura vegetal está concentrada no extremo sul, na região de Parelheiros, e no extremo norte, perto da serra da Cantareira.

O restante da cidade vai mal. Itaim Paulista, bairro da zona leste, por exemplo, tem menos de um metro quadrado de área verde por habitante (a Organização Mundial da Saúde recomenda 12 metros quadrados). Este é apenas um dos motivos para paulistanos e visitantes conhecerem alguns tesouros ambientais da região. Os demais são relaxar, respirar ar puro, recarregar as baterias – e voltar para a correria da selva de pedra.

Trilha da Cachoeira

Fica no Parque Estadual da Cantareira e faz parte do Núcleo Engordador, um dos quatro setores de visitação (os demais são os núcleos da Pedra Grande, Cabuçu e Águas Claras, que também merecem ser visitados). A Cantareira é um fragmento de mata Atlântica com muitas nascentes e córregos.

O nome tem uma origem curiosa: nos séculos XVI e XVII, muitos tropeiros e exploradores cruzavam a região em direção a Minas Gerais. No caminho, os viajantes se abasteciam de água e, antes de seguir caminho, enchiam cântaros vazios para os próximos que passassem por ali. Os vasos eram colocados em prateleiras conhecidas como cantareiras.

A Trilha da Cachoeira fica a dez quilômetros do centro de São Paulo e tem apenas três quilômetros de extensão (ela é circular: ao fim dos três mil metros, atinge-se o mesmo ponto). No trajeto, os caminhantes passam pelas cachoeiras do Tombo, do Véu e do Engordador. A queda d’água mais alta tem 18 metros. O caminho é entremeado pelas muitas curvas do rio Engordador.

Mas há muito mais a ser visto: o tronco de uma embaúba requer seis pessoas para ser abraçado. A mata convida à descontração e podem ser avistados pássaros como tiês-sangue, picharros e sabiás. Com alguma sorte, preguiças, macacos-sauá e bugios cruzarão o caminho dos ecoturistas pelo alto das copas das árvores.

Quase rural

Esqueça o Edifício Itália, a Avenida Paulista, os parques urbanos (as “oficinas de florestas”, como cantou Caetano Veloso). Existe uma São Paulo muito diferente destes cartões postais mais conhecidos – e fica no sul da cidade.

O caminho para a Área de Proteção Ambiental Monos-Carvoeiros é paralelo à antiga estrada de ferro Sorocabana e a entrada fica no túnel 25.

A cachoeira do Jamil é o encontro dos dois rios que dão nome à APA: Monos e Capivari. Ao pé da queda d’água, forma-se uma piscina natural, conhecida como Prainha, onde muitos vão nadar (mas é preciso tomar muito cuidado). O local também é utilizado por muitos campistas.

Um pouco abaixo, no túnel 27, fica a cachoeira da Usina. A Trilha do Marsilac fica perto do bairro da Barragem, o mais meridional de São Paulo, a seis quilômetros do centro do distrito de Engenheiro Marsilac. No local, é possível nadar no rio Capivari (mas é preciso ter experiência) e aproveitar as quedas d’água: Sagui e Funil pedem admiração e fotos.

Muita graça

A cachoeira da Graça fica no Município de Cotia, a menos de 30 minutos a sudoeste do centro de São Paulo, na Reserva Florestal de Morro Grande. A queda d’água é formada pela junção dos rios Cotia e da Graça, que apresentam bom volume d’água durante todo o ano (os últimos tempos são apenas uma exceção).

O caminho é simples. Basta seguir pela Rodovia Raposo Tavares e a Estrada Morro Grande. A trilha tem início na tubulação da SABESP. O percurso até a queda d’água dura cerca de 15 minutos e é considerado leve pelos excursionistas.

Próximo à região, está instalado um espaço para eventos familiares e corporativos (também com o nome de Cachoeira da Graça), fato que contribui para melhorar as excursões para esta região. É um bom local para descansar, praticar esportes, fazer um churrasco e reunir grupos monitorados para prosseguir até os dois rios que formam a cachoeira.

Vila ferroviária

Paranapiacaba é uma vila do Município de Santo André. Foi construída à época em que engenheiros e técnicos ingleses chegaram ao Brasil para constituir a São Paulo Rail Way e construir a Estrada de Ferro Santos-Jundiaí.

Infelizmente, hoje a ferrovia está praticamente desativada: até cerca de 20 anos atrás, era possível tomar um trem no centro da cidade (na Estação da Luz) e descer no centro da vila, que conta inclusive com uma réplica em escala reduzida do Big Ben, o famoso relógio londrino.

A vila, com muitas construções de madeira, merece um passeio, antes de seguir para as trilhas. A cachoeira da Fumaça é a mais visitada nas trilhas de Paranapiacaba. As águas caem em degraus de pedra, em um total aproximado de 70 metros de altura.

Quanto mais chuvoso estiver o período, mais “fumaça” faz a queda d’água, que forma uma piscina natural, de onde as águas seguem serra do Mar abaixo, formando cachoeiras menores. A trilha não deve ser seguida por visitantes desacompanhados: é preciso contratar um guia da região, porque existem muitos atalhos e ramificações que não dão em lugar nenhum. Muitos grupos já se perderam na reserva do vale das Cachoeiras.

A “próxima atração” de Paranapiacaba é bem tímida: a cachoeira Escondida. Em trecho de mata bem fechada, é difícil de ser encontrada pelos visitantes. É uma queda d’água estreita e baixa, visitada especialmente por praticantes de rapel, mas para chegar à parte alta da Escondida, é preciso arriscar-se em uma subida íngreme e escorregadia.

A cachoeira dos Grampos é formada pelas águas do rio Vermelho e forma o mesmo vale com a cachoeira da Fumaça. São 60 metros de queda d’água, sobre degraus de rocha.

Preparando-se para caminhar

Antes de marcar a data, é preciso informar-se sobre os dias e horários de visitação pública, além da disponibilidade de guias. Pensando na preservação ambiental, o melhor a fazer é deixar o carro na garagem e utilizar o transporte público.

As melhores caminhadas são feitas pela manhã, com o Sol mais fraco e a temperatura mais amena. Além disto, é uma forma de aproveitar melhor o dia. Informe-se sobre a previsão do tempo e não inicie uma trilha se houver indícios de chuva.

Não saia das trilhas. Mateiros conseguem reconhecer vários sinais para reencontrar o caminho, mas quem vive na cidade pode se perder com facilidade e passar momentos de terror antes que uma equipe de resgate consiga reencontrar o grupo.

No trajeto, procure não tocar nas plantas. Elas podem ser tóxicas, ou ocultar animais peçonhentos. Nunca toque nos animais: mesmo com aparência mansa, eles podem arranhar e morder; quase sempre, é apenas uma tentativa de defesa, mas mesmo assim é bem dolorosa.

Use roupas leves, de tecidos naturais (preferencialmente, camisas de manga longa e calças compridas). Botas e tênis de cano alto com solado aderente são os calçados mais indicados para as caminhadas. Não se esqueça de levar um agasalho, um chapéu, lanterna e capa de chuva.

Leve alguns lanches leves para o passeio, como sanduíches embrulhados individualmente. Evite doces e alimentos industrializados, para não estimular a sede. E não se esqueça de uma garrafa com água (em alguns casos, ela pode ser reabastecida nas nascentes).

Carregue sua bagagem em uma mochila. Sacolas e bolsas de mão têm muitos inconvenientes: podem se enroscar em canteiros e prejudicam o movimento (às vezes, é preciso usar as duas mãos para vencer alguns obstáculos). Leve uma sacola plástica apenas para guardar o lixo.

Não se esqueça do lema dos excursionistas: não tire nada, além das fotos, não deixe nada, além das pegadas e não mate nada, além do tempo.